Barodontalgia

Para muitos, as férias chegaram. Você sabe o que as férias têm a ver com a dor de dente, mais especificamente a barodontalgia?

Bom, se você ou algum paciente seu for viajar de avião e/ou praticar mergulho autônomo (SCUBA), leia este artigo até o final porque ele pode lhe ajudar a evitar alguns problemas.

barodontalgia
Mergulhadores autônomos devem revisar frequentemente sua saúde bucal para evitar a barodontalgia. Nesta foto eu me preparava para um mergulho autônomo de aproximadamente 20m em correnteza na região de Morro de São Paulo – BA.

Imagina uma coluna de ar sobre você. Essa coluna de ar sobre você é a pressão atmosférica.

Pressão atmosférica é a pressão exercida pela camada de moléculas de ar sobre a superfície. A pressão é a força exercida por unidade de área, neste caso a força exercida pelo ar em um determinado ponto da superfície.

Ao nível do mar, a pressão atmosférica é de 1 atm (760 mmHg). Veja o desenho abaixo.

barodontalgia-pressao-atmosferica-coluna-de-ar

Em altitudes maiores a pressão atmosférica diminui, conforme os dados que seguem.

barodontalgia-pressao-atmosferica-altitude

Imagine o que acontece com um alpinista ou quem voa de avião sem pressurização adequada da cabine. À medida que a altitude aumenta, a pressão atmosférica diminui, ou seja, as moléculas de ar tendem a ficar mais distantes umas das outras.

BARODONTALGIA-pressao-atmosferica-altitude

Da mesma forma, à medida que se aproxima do centro da terra a pressão atmosférica aumenta. Embaixo d’água, além da pressão do ar, deve-se considerar a pressão que a água exerce. Assim, a cada 10m de avanço em profundidade em ambiente sub-aquático a pressão barométrica aumenta em mais 1 atm.

barodontalgia-pressao-atmosferica-embaixo-de-agua

De acordo com a Lei de Boyle:

Em um sistema fechado em que a temperatura é mantida constante, verifica-se que determinada massa de gás ocupa um volume inversamente proporcional a sua pressão.”

Portanto, em grandes altitudes os gases tendem a se expandir. Da mesma forma, em grandes profundidades os gases são comprimidos.

E o que isso tem a ver com odontologia?

Em um dente com solução de continuidade das estruturas duras, por exemplo com uma lesão de cárie, os gases oriundos da fermentação bacteriana podem se expandir ou serem comprimidos.

Barodontalgia-dente

Essa variação na pressão interna do dente pode acabar estimulando as fibras nervosas pulpares ou periapicais provocando dor intensa, a qual muitas vezes pode ser paralisante. Existem relatos e especulações de pilotos que foram abatidos em combate durante a Segunda Guerra Mundial devido à barodontalgia. Lembre-se que as aeronaves não eram devidamente pressurizadas naquela época.


Conceito

Barodontalgia é um sintoma (dor) agudo causado por alterações da pressão barométrica (atmosférica) no dente.

A barodontalgia não é, portanto, uma condição patológica em si. Na maioria dos casos é a exacerbação de uma condição oral subclínica pré-existente, como cárie dentária, restaurações mal adaptadas, pulpite, necrose pulpar, periodontite apical, bolsas periodontais, dentes retidos, fratura radicular, cistos periapicais etc  (Alves, 2012).


História

Os primeiros casos de barodontalgia são de 1923. Mas sem dúvidas, foi na Segunda Guerra Mundial, com o emprego mais amplo de aviões subsônicos em combates, que a incidência se tornou mais preocupante. Os pilotos relatavam dor aguda nos dentes por alguns segundos que diminuía gradualmente após o pouso. Como possíveis causas relatadas estavam alterações pulpares e dentes retidos (Eidelman, 1981; Ellingham, 2003).

A Marinha Americana testou 12.000 pilotos após a Segunda Guerra Mundial, e observou a barodontalgia entre 1.500 e 3.500 metros de altitude. A  Força Aérea Americana registrou que no mesmo período, 114 dos 1.176 aeronavegantes (9,7%) sofreram um ou mais episódios de barodontalgia em seus voos (JOE Editorial Board, 2008; Zadik, 2010).


Classificação

classificacao-barodontalgia
Tabela I. Classificação atual da barodontalgia (Ferjentsik, 1982).

Características clínicas e condições de aparecimento das barodontalgias dentais e não dentais relacionadas

barodontalgia-caracteristicas-clinicas
Tabela II. Características clínicas e condições de aparecimento das barodontalgias dentais e não dentais relacionadas.

Referências Bibliográficas:

1. Clark JB. Risk assessment and clinical aeromedical decision-making. Aviat Space Environ Med. 1993 Aug;64(8):741-7.

2. Cohen S, Hargreaves KM. Caminhos da polpa. São Paulo: Elsevier; 2007. 9ed. p.40-79.

3. Donovan TE, Becker W, Brodine AH, Burgess JO, Cagna DR. Summitt JB. Annual review of selected dental literature: Report of the Committee on Scientific Investigation of the American Academy of Restorative Dentistry. J Prosthet Dent 2008;100:110–41.

4. Eidelman D. Vertigo of dental origin: case reports. Aviat Space Environ Med. 1981 Feb;52(2):122-4.

5. Ellingham HK. Dentistry in the military. Br Dent J. 2003 Jan 11;194(1):5

6. Ferjentsik E, Aker F. Barodontalgia: a system of classification. Mil Med 1982;147:299–304.

7. Gonzalez-Santiago Mdel M, Martinez-Sahuquillo Marquez A, Bullon- Fernandez P.Incidence of barodontalgias and their relation to oral/dental condition in personnel with responsibility in military flight. Med Oral 2004;9:98–105.

8. Hanna HH, Thomas-Yarington C. Otolaryngology in aerospace medicine. In: DeHart RL, ed. Fundamentals of aerospace medicine.Philadelphia, PA: Lea and Febiger; 1985:525–36.

9. Harvey W. Dental pain while flying or during decompression tests. Br Dent J 1947;82:113–8.

10. Hutchins HC, Reynolds OE. Experimental investigation of the referred pain of aerodontalgia. J Dent Res 1947; 26:3– 8.

11. JOE Editorial Board. Pain and anxiety control: an online study guide. J Endod 2008;34:e165–79.

12. Kennebeck R, Knudtzon KF, Goldhush AA, et al. Symposium on problems of aviation dentistry. J Am Dent Assoc 1946; 33:827–44.

13. Kollmann W. Incidence and possible causes of dental pain during simulated high altitude flights. J Endod 1993; 19:154 –9.

14. Levy BM. Aviation dentistry. Am J Orthodont Oral Surg 1943; 29:92–5.

15. Lurie O, Zadik Y, Einy S, et al. Bruxism in military pilots and non-pilots: tooth wear and psychological stress. Aviat Space Environ Med 2007; 78:137–9.

16. Mjör IA, Ferrari M. Pulp-dentin biology in restorative dentistry. Part 6: reactions to restorative materials, tooth-restoration interfaces, and adhesive techniques. Quintessence Int 2002; 33:35–63.

17. Mumford JM. Pain from the periodontal tissues. In: Mumford JM, ed. Orofacial pain. 3rd ed. Edinburgh: Churchill Livingstone; 1982:234–5.

18. Murray PE, Windsor LJ, Smyth TW, et al. Analysis of pulpal reactions to restorative procedures, materials, pulp capping and future therapies. Crit Rev Oral Biol Med 2002;13:509–20.

19. Orban B, Ritchey BT. Toothache under conditions stimulating high altitude flight. J Am Dent Assoc 1945;32:145–80.

20. Rauch JW. Barodontalgia—dental pain related to ambient pressure change. Gen Dent 1985;33:313–5.

21. Rayman RB. Aircrew health care maintenance. In: DeHart RL, ed. Fundamentals of aerospace medicine. Philadelphia, PA: Lea and Febiger; 1985:407.

22. Ritchey B, Orban B. Toothache at altitude. J Endod 1946;1:13–7.

23. Robichaud R, McNally ME. Barodontalgia as a differential diagnosis: symptoms and findings. J Can Dent Assoc 2005;71:39–42.

24. Rossi DG. Health Policy Directive no. 411: Aviation and diving–dental considerations. Surgeon General, Australian Defence Force; 1995.

25. Seltzer S, Bender IB. Pulpitis from operative procedures. In: The dental pulp, 3rd ed. Philadelphia, PA: J.B. Lippincott Co.; 1984:252–73.

26. Senia ES, Cunningham KW, Marx RE. The diagnostic dilemma of barodontalgia: report of two cases. Oral Surg Oral Med Oral Pathol 1985; 60:212–7.

27. Shiller WR. Aerodontalgia under hyperbaric conditions. Oral Surg Oral Med Oral Pathol 1965;20:694–7.

28. Sognnaes RF. Further studies of aviation dentistry. Acta Odontol Scand 1946; 7:165–73.

29. Verunac JJ. Recurrent severe facial emphysema in a submariner. J Am Dent Assoc 1973;87:1192–4.

30. Zadik Y, Chapnick L, Goldstein L. In-flight barodontalgia: analysis of 29 cases in military aircrew. Aviat Space Environ Med 2007;78:593–6.

31. Zadik Y. Aviation dentistry: current concepts and practice. Br Dent J 2009;206:11–6.

32. Zadik Y Barodontalgia: what have we learned in the past decade? Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2010 Apr;109(4):65-9.

33. Alves MFVM. A barodontalgia em voo e o diagnóstico diferencial de dor odontogênica: relato de caso. Rev Odontol Unesp. 2012; 41(4): 287-91.

34. de Assis C. Barodontalgia. Rev Bras Odontol. 2012; 69(2): 216-9.


E aí, gostou? Se gostou, tem dúvidas, críticas ou sugestões, deixe o seu comentário abaixo! A sua opinião é muito importante para mim.

Não deixe de se cadastrar no blog e assinar o canal do YouTube. Em breve várias outras aulas e material para você aperfeiçoar sua prática clínica.

Sorria! Sucesso!

Forte abraço!

Welington

4 Comentários


  1. muito legal! coisas que não aprendemos na faculdade! parabéns pelo material tão bem preparado.


    1. Olá Lygia! Muito obrigado pelo interesse e pela participação. Fico feliz que tenha gostado do material. Não deixe de cadastrar o seu email aqui no blog para receber as novidades em primeira mão. Forte abraço, Welington.


    1. Olá Mônica! Muito obrigado pelo interesse e pela mensagem. Fico feliz que tenha gostado. Abraço.

Comentários encerrados.